Dez Anos de Empreender
Há dez anos eu abria minha própria empresa. Muita coisa aconteceu na minha vida e na minha carreira desde então. Esta é uma jornada de apreciação desta grande aventura que caminha paralela ao Viver Mais Simples. A jornada de construir o meu trabalho autoral, com coragem e a colaboração de muita gente boa. Este é um texto sobre gratidão, ousadia, alegria e avançar com medo e tudo. Sobre inovar, errar, refazer e prosseguir. Tudo misturado.
Os primeiros anos. Os primeiros erros…
A Nutshell Estratégia Consultoria nasceu no dia 26 de maio de 2010, por conta de um projeto que nunca veio a acontecer. Antecipando a necessidade de uma nota fiscal, abri meu CNPJ com o Lucrécio ( meu então marido), como sócio. Uma conhecida dos tempos de pesquisa havia me pedido uma proposta e nunca me respondeu, tamanha a falta de noção do escopo e valores propostos por mim…
Este não foi o único erro do começo: meu primeiro projeto acabou sendo uma uma permuta com a Carpa Design da querida amiga Tati Menegatti. Eles fizeram a minha primeira marca: uma árvore representando o meu propósito da época “ajudar os outros a frutificar, sendo felizes”. Ainda me achando executiva, encomendei 300 pen drives em madeira e 100 relógios com post its, pensando em promover minha marca. Eu não tinha nenhum outro cliente, nem site, nem muita clareza do que faria a seguir. As onze caixas e um saldo negativo desnecessário foram minha primeira lição como empreendedora.
Com o tempo, distribuí os pen drives e relógios. E atingi o esperado “breakeven” da Nutshell. Ou seja, finalmente começou a entrar mais do que sair. Mas foram alguns meses que poderiam ter sido evitados, caso eu soubesse um pouco mais sobre empreender e eventualmente aprendesse a começar menor para ir aumentando no ritmo dos sucessos. Com muitas recaídas, claro, que sempre fui de me empolgar…
As primeiras parcerias
Os primeiros anos foram de muito aprendizado por tentativa e erro: alguns poucos clientes de Organização de Ideias e os primeiros workshops em parceria. Eu estava um pouco mais informada, após ter feito um curso de Empreendedorismo no nascente Rio Criativo. Lá reencontrei Guilherme Velho, que viria a ser fundamental na minha trajetória. E as amigas Samara e Thaís Teixeira, com quem teria muitas outras aventuras. Em maio de 2011, fundava o Odisseia com a comadre e amiga Érica Cavour. Uma terapeuta e uma organizadora de ideias a serviço da satisfação pessoal e profissional. Estreamos com uma palestra histórica no saudoso Bees Office, do amigo Cadú de Castro Alves, que eu tinha conhecido ao pesquisar sobre o mercado então incipiente de espaços de Coworking. Foram 40 participantes, registrados pela então cliente Simxer. Tivemos a presença de minha mãe Patricia e do pai de Érica, o saudoso tio Márcio. Várias das pessoas ali fariam história como amigos e clientes (o que muitas vezes acontece comigo). Após a palestra, formamos a primeira turma Odisseia (faríamos muita outras até o fim do projeto, em 2018). No final de 2011, nasce o Onionvation com Gian Taralli, colega dos tempos de Johnson & Johnson: aqui a proposta era “descascar a cebola”, ou seja, retirar camadas de conformismo e máscaras que interrompiam o fluxo de criatividade. O Onionvation foi o primeiro de muitos projetos junto com Gian, numa dobradinha que sempre combinou autoconhecimento e gestão de mudança.
No final de 2012, foi a vez de me juntar a Beth Veiga, colega dos tempos de Souza Cruz, para fazer um plano de negócio de um espaço de eventos multiuso. O projeto era ambicioso demais e uma consultoria com o Daniel Pereira revelou a fragilidade e risco que corríamos. Com base em conceitos de Start Up Enxuta e de Business Canvas, Beth e eu radicalizamos: decidimos lançar um negócio com custo mínimo, quase que totalmente variável. Assim nasceu o Comida para Viagem, delivery artesanal com muito charme e sabor. Chegamos a expandir para eventos até eu decidir focar na Organização de Ideias e Workshops. Beth fez muitos coffee breaks deliciosos para eventos do Odisseia, anos depois. Outras parcerias importantes foram nas Oficinas e Cafés Viver Mais Simples com parceiros ilustres como Lucrécia Corbella, Simxer, Álvaro Esteves, Samara Martins, Ana Vine…. Nos workshops Play & Plug com a amiga dos tempos de trainee Marcia Penna. Nas Rodas de Conversa com Maurício Luz e Carol Wosiack. E mais recentemente, numa parceria com Adriana Pires e Clarissa Biolchini.
Um endereço próprio
Em 2014, eu estava atendendo empreendedores do Rio Criativo. De aluna havia me tornado consultora de startups. Ás vezes, eu atendia em cafés ou espaços públicos. Até o dia em que fiz uma pergunta mais funda e uma das minhas clientes começou a chorar muito em pleno café do Museu da República. Um vizinho ao lado tentou ajudar e o constrangimento foi geral. Ali decidi que precisava de um espaço para oferecer mais privacidade a meus clientes.
Indicada por minha tia Gigi, esbarrei na Millerbaum, de Roberta Miller. E subloquei um charmoso escritório na 13 de Maio. Até que a proprietária ameaçou um aumento e eu pedi um apoio ao meu pai. Ele me surpreendeu, patrocinando a sala comercial que é o endereço oficial da empresa hoje. Este gesto foi muito especial para mim. Afinal eu sabia o quanto custava para o engenheiro da Petrobrás apostar num sonho tão diferente do seu. Uma prova de confiança que me nutre até hoje, anos depois de sua morte.
Mudança de sócio
Em 2014, eu já havia começado uma nova aventura com meu irmão Caio Carneiro. A Argo surgiu do encontro de nossa paixão comum por empreendedorismo, estratégia e identidade. Ele, designer. Eu, coach, agora mais experiente depois de fazer 18 meses de formação no EcoSocial. A nova sociedade frutificou em dois anos de trabalho com o SEBRAETEC e pessoas físicas. Fizemos posicionamentos pessoais e identidade visual para negócios diversos, da cachaça Sete Engenhos á construção civil. Foi uma época de muita efervescência e muitas notas fiscais emitidas. Eu e Caio nos encontrávamos toda semana e foi uma forma muito feliz de celebrar nosso amor de irmãos. A Argo durou até que os trabalhos do SEBRAETEC escasseassem e mais uma vez eu ouvisse o meu chamado principal, que era Desenvolvimento Humano. A Argo foi então encerrada, mas a parceria com Caio seguiu de outras formas e ele continuou como meu sócio por alguns anos ainda.
A volta ao mundo corporativo
Desde o Rio Criativo, eu vinha ensaiando um retorno ao mundo das grandes organizações. Nesta época, o Odisseia estava bem fortalecido e tínhamos vários clientes executivos, em busca de clareza sobre sua trajetória profissional e próximos passos. Michel Gomberg tinha sido cliente de Érica e decidiu fazer o Workshop Odisseia. Seguimos juntos com um trabalho de coaching e ele nos convidou para experimentar o modelo Odisseia na Coca-Cola, em 2013. Foi o início de uma parceria muito rica que rendeu cerca de vinte workshops. Foi um trabalho na Coca-Cola que também selou o final do Odisseia, no fim de 2018. Mas a colaboração com Michel não parou. No Congresso Mundial de Psicologia Positiva em Melbourne, apresentamos um poster inspirado num workshop sobre Gratidão que havíamos feito anos antes. No início deste ano, eu e Michel estreamos uma parceria na mesma Coca-Cola, só que em Bogotá. Há anos Michel deixou a vida de executivo, fez seu mestrado em Psicologia Positiva na Austrália e é um coach e consultor de muito talento.
Já fiz muitos workshops corporativos desde então, e, além de Organização e (Re)Orientação de Carreira, hoje trabalho fortemente com as famosas Power Skills, as competências atitudinais e comportamentais que tornam as relações interpessoais mais ricas e o trabalho mais proveitoso. Foram muitas outras aventuras em parcerias diversas, ora com Érica, ora com Gian, ora com Michel. E também solo, que com o tempo fui encontrando um ritmo e um jeito de lidar com a avalanche de emoções e desafios de uma grande organização, mesmo quando estou sozinha.
O Voe…
Eu já tinha experimentado projetos mais pessoais na curta e intensa experiência do Coletivo Baobá, uma ação social que fiz durante quatro meses junto á Comunidade do Vidigal. O Voe foi um novo movimento neste sentido. O sonho de fazer um coletivo voltado para o florescer da autenticidade. Aqui, meu propósito era “Despertar com palavras o florescer do outro”, já refinado após os meses de estudo do coaching antroposófico. O Voe foi um experimento ousado. Começou com miniworkshops em vários lugares e desaguou num evento de um dia, um verdadeiro festival. Com 20 impulsionadores, a maioria vindo do Rio em caravana para se hospedar numa casa alugada, o Voe foi o meu projeto mais transformador. Na época, não dei conta da intensidade envolvida e do modelo não sustentável. Ainda fiz um experimento na Laje, com o Inove-se, mas finalmente pus o Voe em modo “soneca”…
Educação: uma nova experiência
Eu já atuava como facilitadora há tempos pelo Odisseia, Onionvation e outros experimentos quando, um pouco antes do Voe, conheci Patricia Cotton. Ela tornou-se minha cliente, impulsionadora Voe e amiga. Um dia me indicou para aplicar uma de suas aulas na Affero Lab, negócio especialista em Educação Corporativa. De lá para cá, a parceria com a Affero se consolidou e me trouxe novos saberes sobre Andragogia e Facilitação, além de um gosto renovado por estudos. A Affero também foi responsável por um convite que mudou minha trajetória… Eles me propuseram montar um programa sobre Inclusão e Diversidade, ancorados na minha experiência pessoal de estudante de Comunicação Não Violenta com o mestre Sergio Harari e na experiência pessoal de ser esposa de um homem negro. O convite abriu uma janela inesperada e despertou uma verdadeira paixão. Assim se delineavam com mais clareza os atuais quatro pilares de meu trabalho:
ORGANIZAÇÃO DE IDEIAS + (RE)ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL + INTELIGÊNCIA EMOCIONAL + INCLUSÃO E DIVERSIDADE
Em 2018, fui convidada pelo Gustavo Caldas Britto para montar o Escafandro, um curso sobre Resiliência e Inteligência Emocional para a Escola de Rebeldia, da Reserva. Aqui se consolidou minha paixão por trabalhar temas como Vulnerabilidade, Coragem, Empatia e tantos outras habilidades necessárias para humanizar as relações.
Revoluções por minuto
A trajetória do meu empreender não teve nada de linear ou de previsível. No começo, eu navegava mais tranquila com a reserva dos tempos de empresa. Mais logo comecei a alternar ondas de insegurança com euforia. A decisão de não ter carteira assinada levou tempo para se assentar em mim. Ainda hoje bate um medo, de vez em quando. Mas nada se comparou a conciliar meu trabalho sempre em movimento com uma série de perdas pessoais. Em 2016, eu finalizava a Argo e também meu casamento de mais de vinte anos com meu primeiro sócio. Ainda me recuperando das fortes emoções do Voe, vivendo o início da recessão que só se agravou, eu precisei me reinventar como CPF e CNPJ. Em 2017, meu pai morreu. Eram tempos difíceis, de pouco trabalho. Na vida pessoal, eu me reencontrava com o amor, construindo um novo relacionamento com meu atual marido, Lennom.
No final de 2018, as coisas começavam a caminhar, mais projetos com a Affero, outras possibilidades se desenhando. Foi quando descobri que meu irmão Caio, meu sócio e parceiro de Argo e Voe, tinha câncer.
Os últimos dois anos foram os mais sóbrios de minha trajetória. Um foco quase que exclusivo no mundo corporativo, uma longa viagem de autoconhecimento á Austrália, incluindo o Congresso de Psicologia Positiva e a decisão de me recasar. A retomada de estudos na Sociedade Brasileira de Dinâmicas de Grupo (SBDG). Muito trabalho, uma casa nova e a espera cotidiana por notícias de melhoras do Caio. Mas a melhora nunca veio e em janeiro tomei a decisão mais difícil em todos estes anos de empresa. Mudar de sócio novamente.
Vida Morte Vida
A piora gradativa do Caio coincidiu com o surgimento de uma nova figura jurídica: a Sociedade Unipessoal. Uma forma de eu manter meu CNPJ sem nenhum sócio. Foi um processo difícil e necessário. Caio foi gentil, como sempre. Disse-me que eu estava simplificando a vida dele. Assinamos a dissolução da sociedade em 15 de janeiro. Nasceu Leticia Carneiro Desenvolvimento Humano. No dia 30, me despedi do meu irmão.
O mês era março de 2020. Vinha de projetos, propostas e muitas viagens, incluindo quatro workshops lindos sobre vulnerabilidade em Bogotá, para o time da Coca-Cola liderado pelo querido Rafael Prandini. Sinto-me ansiosa, exausta e triste. O trabalho é um corrimão para a dor indizível de perder meu irmão caçula.
E então, paramos. O Covid-19 subitamente cancelou projetos, interrompeu o trabalho no escritório da Cinelândia. Parei de viajar e respirei.
Dois meses depois, mudei oficialmente meu escritório para o quarto de empregada. Daqui trabalho em poucos e potentes projetos de forte cunho social. Quatorze planos de vida para pessoas atingidas pelo desastre em Mariana. Mediação e costura na construção de uma política de Enfrentamento ao Assédio e Discriminação para uma Fundação. Dois workshops para humanizar o processo de demissão de 20% do quadro de uma grande agência de publicidade. Clientes em busca de um caminho profissional em tempos incertos.
Trabalho menos, sem sair de casa, usando novos recursos. A formação da SBDG segue em suspenso, após alguns encontros on-line. Para minha surpresa, tenho o melhor fluxo de caixa dos últimos anos (e as menores despesas também). Claro que nem tudo são rosas. O desafio de uma nova rotina afeta o sono e a sanidade. Ás vezes, preciso desmarcar sessões para poder me cuidar. Mas o tempo em casa me ajudou a cuidar das feridas da saudade. Abriu meus olhos para o quão longe eu estava do Viver Mais Simples. Despertou um desejo de estudar, aprender, reinventar-me.
Olhando no retrovisor, contemplo com gratidão e orgulho cada etapa desta jornada, que compartilho com vocês aqui. Do primeiro sócio Lucrécio, ao último, Caio. Meu pai e Marília, patrocinadores da sala comercial hoje fechada. Lennom, companheiro de pandemia que me ajuda a empreender do quarto dos fundos. Érica, companheira do Odisseia, projeto formador de mim mesma. Gian, Cadú, Samara, Lucrécia, Guilherme Velho, Daniel, Simxer, Guilherme Azevedo, Marcia, Beth. Clarissa, que fez o primeiro caderno Odisseia. Álvaro, Daniela, Ana, Patty, Maurício, Pamela, Ana, Lívian, Fernando, Júlio, Paula, Juliana, Diego, Raquel e Bettina. Clarissa e Julia. Cada parceiro na Affero (especialmente Adriana, Aline, Eugênio e, agora, Patricia). Michel e tod@s na Coca. Luciana, Carol, Gustavo, Gui, Fernando e tod@s da Reserva. Adriana Pires. Sérgio Harari. Marcão e Versteeg. Toda a turma do Instituto Criare e da Renova. Tod@s clientes de Organização de Ideias, de Odisseia, de Onionvation, de eventos no Impact Hub, Baukurs, Anitcha, Laje. Tod@s voadores e voadoras. Luciano, Meiri e tod@s do EcoSocial. E agora, a turma da SBDG.
Sei que vou esquecer alguém, desde já me perdoe. São dez anos de amizade, parceria, amor, travessia e travessuras. Muito amor envolvido.
O que vem por aí…
São tempos de gestação. Leticia Carneiro Desenvolvimento Humano tem missões muito claras: Ajudar pessoas a alcançarem sua potência (Torna-te quem tu és). Contribuir para processo de humanização das organizações.
Após dez anos de experimentação e aguçar meu foco, estes são meus sonhos de bom tamanho:
- Seguir humanizando relações por meio de parcerias com a Affero e o mundo corporativo.
- Aprofundar meus conhecimentos e prática por meio da Formação na SBDG e estudos sobre Facilitação On-Line com a Aprendix Global.
- Seguir com projetos de (re)orientação de carreira, organização de ideias, inteligência emocional e Inclusão e Diversidade.
- E quando pudermos sair de casa: fazer o mestrado em Psicologia Positiva da Penn University.
As duas maiores novidades são os dois projetos que estou gestando no momento: o renascer do Voe, no formato on-line, em parceria com Álvaro Esteves. E colaborar com o projeto Todas Group de fortalecimento de profissionais mulheres. Em breve, notícias sobre estes dois caminhos.
Daqui do fundo de casa, para o mundo. Com calma, passo a passo, de máscara (por enquanto).
Dez anos se passaram. Que venham mais dez.